Publicado originalmente AQUI Ó.
Há quatro meses me tornei mãe de menina.
Desde que engravidei tinha aquela certeza interna de carregar
uma menina. Inicialmente o ultrassonografista disse ser outro menino, mas
alguma coisa dentro de mim me dizia para esperar e foi o que fiz.
Veio a novela do nome – um dia escrevo direito sobre isso,
acho – e aquela curiosidade gostosa de saber como seria o rostinho da minha bb.
E no dia 05 de janeiro deste ano, três dias depois do
aniversário de dois anos do irmão, a Clara chegou.
Tão linda, tão esperta, com
aqueles olhões arregalados para mim, tão calma, tão gostosa de segurar, de
cheirar, com uma micro boquinha vermelha carmim, pela branquinha e cabelos
ralos e escuros. Tão emocionante ouvir seu choro. Tão bom sentir seu rosto
junto ao meu antes de sair da sala de parto. De repente aquela emoção do
nascimento do primeiro filho estava de volta, agora em forma de menina.
Foi e tem sido igualmente assustador. Olhar para a minha
filha é olhar para mim mesma de um jeito totalmente novo, diferente. É me
enxergar refletida. É revisitar cada uma das mulheres da minha família.
Nos últimos anos inevitavelmente tenho reconhecido essas
mulheres em mim. Vejo muito da minha avó materna, na mania de passar tudo pela
água, na chatice com o marido ao volante, na rotina diária da casa. Vejo minha
avó paterna, sovo meus pães com a mão dela virtualmente repousando sobre a
minha, vejo meus movimentos parecidos com os dela, o gosto pela casa cheia, o
desejo de muitos filhos (ela teve nove), o “dom da reclamação” sobre todas as
coisas e a curiosidade sobre tudo. Vejo minha mãe, a cara de brava dando bronca
nos filhos, a criatividade para inventar brinquedos e brincadeiras nos dias
chuvosos. Vejo minhas tias, as risadas de algumas, a vontade de esganar de
outras e assim percebo que sou uma tela feita de pinceladas diversas de
aquarela, de cores diversas que produziram novas nuances ao entrar em contato
com os reagentes contidos em mim mesma e que refletem agora uma imagem única,
exclusiva, ainda que muito parecida com algumas ou todas elas, não caricata,
autêntica.
E temo. Não que o resultado tenha sido ruim... falaria eu
mal de mim ou delas?
Temo de um jeito não assombrado, mas ansioso pela nova tela
que tenho em mãos: minha pequena e silenciosa Clara. Que reagentes tem ela em
sua natureza? A tela parece branca, mas sei que não é apenas isso. Sei que logo suas cores
surgirão, sutis inicialmente, mais fortes e seguras no futuro. E tudo o que
desejo é ter a mão leve, o espírito aberto, os olhos criativos, o traço firme,
mas não rude, para que ela reflita a mais bela obra já vista.
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